Declaração de Interpretação n.: 29
A função social do contrato de seguro de responsabilidade civil permite ação direta do terceiro em face da seguradora, não obstante os direitos da seguradora em face do segurado (teoria do reembolso).
Autor(a): ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção.
Declaração de Interpretação n.: 30
É válida a limitação da reparação civil no contrato de transporte de coisas regido pelo Código Civil (art. 750) e no transporte internacional, pela Convenção de Montreal (Decreto n.º 5.910/2006), ressalvadas as relações de transporte de coisas regidas pelo Código de Defesa do Consumidor, em que a reparação civil é ilimitada (art. 6º, VI, 14 e 20).
Autor(a): ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção.
Declaração de Interpretação n.: 31
O art. 413 do Código Civil determina a redução da cláusula penal em razão de dois fatos distintos, quais sejam: a) cumprimento parcial da obrigação; b) excessividade da cláusula penal. Quanto à primeira hipótese, nada mais é exigido para que se opere a redução, além do cumprimento parcial da obrigação. A recomendação de que se tenha em vista a “natureza” e a “finalidade” do negócio somente se aplica à segunda hipótese, de excessividade da cláusula penal.
Autor(a): GONÇALVES, Carlos Roberto.
Declaração de Interpretação n.: 32
O benefício da recuperação judicial da empresa não estende seus efeitos aos avalistas, devedores solidários ao devedor principal, mas apenas aos sócios solidários da sociedade empresária. A mesma interpretação se aplica aos títulos de crédito regulados em leis especiais.
Autor(a): GONÇALVES, Carlos Roberto.
Declaração de Interpretação n.: 33
A expressão “garantias especiais” constante do art. 300 do CC/2002 refere-se a todas as garantias que tenham sido prestadas voluntária e originariamente pelo devedor primitivo ou por terceiro, vale dizer, aquelas que dependeram da vontade do garantidor, devedor ou terceiro, para se constituírem.
Autor(a): DELGADO, Mário
Declaração de Interpretação n.: 34
O instituto da separação legal, quer judicial ou extrajudicial, permanece vigente e plenamente eficaz no ordenamento jurídico brasileiro mesmo após a edição da EC nº 66 , cuja principal conseqüência foi expurgar do ordenamento qualquer requisito temporal , tanto para a separação, como para o divórcio.
Autor(a): DELGADO, Mário
Declaração de Interpretação n.: 35
A regra do art. 1.683, do Código Civil, a respeito da verificação dos aquestos à data em que cessou a convivência dos cônjuges (início da separação de fato), deve ser aplicada aos regimes de comunhão (universal e parcial), não se restringindo ao regime da participação final nos aquestos.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
Declaração de Interpretação n.: 36
A expressão “outra causa duradoura”, constante do art. 1.767, II, do Código Civil, abrange, além dos casos dos surdos mudos que não têm tiveram educação que os habilitasse a declarar suas vontades, as hipóteses de doenças graves que tornam a pessoa completamente inapta a se comunicar.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
Declaração de Interpretação n.: 37
Na responsabilidade médica, a inversão do ônus da prova, se aplicada, fica restrita à fase de instrução probatória.
Autor(a): SERRA VIEIRA, Patricia Ribeiro
Declaração de Interpretação n.: 38
Ao profissional médico são aplicáveis as disposições do artigo 951 do C.C., independentemente de a obrigação por ele assumida ser de meio ou de resultado.
Autor(a): SERRA VIEIRA, Patricia Ribeiro
Declaração de Interpretação n.: 39
A empresa individual de responsabilidade limitada poderá ser constituída por pessoa jurídica, admitida sua participação em mais de uma empresa dessa modalidade.
Autor(a): SOUZA GUIMARÃES, Márcio.
Justificativa: O caput do art. 980-A fez alusão à possibilidade da constituição da EIRELI por uma única “pessoa”. Quando pretendeu restringir à pessoa natural, o fez no § 2º, aduzindo que a pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade .
Declaração de Interpretação n.: 40
O patrimônio social da empresa individual de responsabilidade limitada responderá pelas dívidas da pessoa jurídica, não se confundindo com o patrimônio da pessoa natural que a constitui, sem prejuízo da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.
Autor(a): SOUZA GUIMARÃES, Márcio
Justificativa: O veto presidencial ao §4º do art. 980-A do Código Civil pode levar a duas interpretações, que merecem ser afastadas: 1) a diferenciação patrimonial entre o patrimônio da pessoa constituinte da EIRELI estaria mitigada e 2) por essa razão, seria descabida a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.
Declaração de Interpretação n.: 41
É inoportuna a proposição, ora em tramite, de editar-se novo Código Comercial (PL 1572/2011), sendo preferível promover a alteração legislativa pontual das soluções previstas pelo Código Civil que se mostram disfuncionais ou que a experiência comprovada no decênio transcurso desde a sua vigência mostra ser aconselhável modificar.
Autor(a): MARTINS-COSTA, Judith.
Justificativa: Encontra-se em discussão pública texto de projeto de um novo Código Comercial56, com o objetivo de reunir princípios e normas aplicáveis à atividade empresarial, sob o argumento de a codificação vigente ser “anacrônica” e desatender ao princípio da segurança jurídica a vigente regulação das relações empresariais57. Segundo o Professor Fábio Ulhôa Coelho, autor do anteprojeto, “a unificação do direito privado contraria uma tendência mundial – apenas a Itália fez movimento semelhante na época do fascismo – e resulta no enfraquecimento dos valores e princípios que regem os negócios, como o da livre concorrência”58.
Objeta-se a esses argumentos com dados factuais e com crítica eminentemente técnico-jurídica, ressalvando-se o respeito intelectual devido aos Excelentíssimos Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e Professor Fábio Ulhôa Coelho.
1. Primeiramente, o Código Civil não unificou o Direito Civil e o Comercial, ou mesmo “copiou” o Direito Italiano, como tem sido dito e repetido sem base factual adequada, mas, tão somente, a atividade negocial (obrigações civis e comerciais), seguindo modelo diverso daquele adotado “pela Itália do fascismo” e diretamente derivado das proposições sistemáticas desenvolvidas por Teixeira de Freitas59.
1.1. O modelo italiano, é bom lembrar, unifica o Direito Privado, incorporando ao Código Civil as relações comerciais e trabalhistas, o que não ocorre entre nós. Como explicitou Miguel Reale na Exposição de Motivos ao Anteprojeto de Código Civil: “[…] do corpo do Direito das Obrigações se desdobra, sem solução de continuidade, a disciplina da Atividade Negocial. Naquele se regram os negócios jurídicos; nesta se ordena a atividade enquanto se estrutura para o exercício habitual de negócios. Uma das formas dessa organização é representada pela empresa, quando tem por escopo a produção e a circulação de bens ou de serviços”60.devido aos Excelentíssimos Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e Professor Fábio Ulhôa Coelho.
1.2. Também cabe objetar a alegada “tendência mundial” no sentido da dicotomia entre direito civil e comercial, bastando lembrar que os países de common law sequer reconhecem tal dicotomia em matéria de obrigações.
2. Em segundo lugar, foi pensamento dos autores do Anteprojeto do Código Civil justamente resguardar as especificidades das relações interempresariais, situando no Código Civil as normas gerais incidentes à atividade empresarial e deixando para legislação “aditiva” a regulação de aspectos peculiares a essa atividade (mantendo intacta, por exemplo, a Lei das S/A), ou menos propensos à estabilidade no tempo a que um corpus codificado induz. Como bem apontou Miguel Reale, um Código, em nossos dias, não se pode apresentar como “lei total”, mas apenas como “lei básica, mas não global” do direito privado61, devendo estar apto, tecnicamente, para mediar a polaridade entre permanência e ruptura, ou entre segurança e dinamismo. Assim, acolheram-se no Código Civil apenas soluções normativas já sedimentadas pela experiência, deixando-se para disciplinar os aspectos ainda não dotados de certa sedimentação e estabilidade para leis especiais (chamadas por Reale de “leis aditivas” ao Código62) mais facilmente ajustáveis às mudanças econômicas e sociais.
2.1. Essa louvável (embora ainda largamente incompreendida) opção metodológica dos autores do Anteprojeto de Código Civil é particularmente presente na regulação da atividade negocial. Considerando a tensão, ínsita ao Direito, entre os polos de duração (estabilidade) e mudança (dinamismo), avaliou-se a incompatibilidade entre as necessidades da atividade empresarial e uma sua regulação exaustiva, minudente, omnicompreensiva, globalizante. A regulação feita no Código Civil preocupou-se em preservar – não codificando – um vasto setor da atividade negocial empresarial que é, por suas características, mais fortemente sujeita à necessidade de mudanças, ou mesmo afastando das normas gerais próprias da atividade empresarial algumas atividades que, por receberem diversa valoração social, hão de ter resguardadas as suas peculiaridades. Exemplifique-se com as atividades do pequeno empresário, caracterizado pela natureza artesanal da atividade; da grande empresa (habitualmente formada sob a veste de sociedade anônima); a atividade negocial dos que exercem atividade profissional artística, literária ou científica, ainda que se organizem para tal fim; e a do empresário rural, todas elas afastadas, no vigente Código Civil, da conceituação como “atividade empresária”, atendendo o ensinamento do Professor Sylvio Marcondes, constante da Exposição de Motivos do Anteprojeto de Código Civil, in verbis: “Dessa ampla conceituação [de empresário] exclui, entretanto, quem exerce profissão intelectual, mesmo com o concurso de auxiliares ou colaboradores, por entender que, não obstante produzir serviços, como o fazem os chamados profissionais liberais, ou bens, como o fazem os artistas, o esforço criador se implanta na própria mente do autor, de onde resultam, exclusiva e diretamente, o bem ou o serviço, sem interferência exterior de fatores de produção, cuja eventual ocorrência é, dada a natureza do objeto alcançado, meramente acidental”.
2.2. No entanto, o projeto de um “novo” Código Comercial despreza essas peculiaridades. Em técnica criticável (entre os vários exemplos que poderiam ser oferecidos), define no art. 9o, o empresário como aquele quem “sendo pessoa física ou sociedade, está inscrito como tal no Registro Público de Empresas”, confundindo, smj, a eficácia do registro; ao mesmo tempo dispõe, no seu art. 3º, “não se considera[r] empresa a atividade de prestação de serviços própria de profissão liberal, assim entendida a regulamentada por lei para cujo exercício é exigida formação superior”, deslocando, para o art. 13, a exceção: “Não é empresária a pessoa física ou jurídica que explora as atividades relacionadas no art. 3º deste Código, ainda que conte com o concurso de auxiliares ou colaboradores”. Ao assim proceder, a par das impropriedades de técnica legislativa e da confusão entre as eficácias defluentes do registro, a proposição acaba por incluir na definição de “empresário” os que exercem profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística que conte com o concurso de auxiliares ou colaboradores, desatendendo às escalas valorativas pontuadas por Reale e Marcondes63.
2.3. Fundamentalmente: o método pelo qual o Projeto define empresário, parece desconsiderar a grande relevância da conjugação entre as noções de “negócio jurídico” e “atividade negocial”, um dos pontos altos do Código Civil, sendo a noção de “atividade” nodal para a Teoria da Empresa, campo em que nasceu64, muito embora já não aí esteja confinada65.
3. Quanto à “insegurança” referida pelo Exmo. Sr. Ministro da Justiça, crê-se não ser procedente a crítica e – igualmente – o solucionamento proposto por via de um novo Código Comercial cujo Projeto se apresenta (i) omnicompreensivo e (ii) alegadamente “principiológico” (como tem anunciado o ilustre Professor Fábio Ulhôa Coelho).
3.1. Quanto ao primeiro aspecto, basta ter presente que a “Minuta de Código Comercial”, (sic) estampada em livro feito publicar pelo ilustre Professor Coelho66 apresentava 1076 artigos, ao passo que o projeto legislativo encaminhado à Câmara dos Deputados durante o mesmo ano de publicação da obra, 2011 – reduziu-os a 670. Ora, certo é que a insegurança, no Direito, provém, justamente, de soluções açodadas e de opções tecnicamente deficientes, alheias aos requisitos de certeza e previsibilidade minimamente exigíveis para assegurar a normal viabilidade do tráfego jurídico. Do mesmo modo, espanta a contraditoriedade em defender-se a revogação de parte substancial do Código Civil apenas 10 anos apos a sua entrada em vigor em nome da segurança jurídica, que tanto depende da estabilidade e amadurecimento das instituições, e da previsibilidade das regras legais.
3.2. Quanto ao segundo aspecto, isto é, o referente ao anunciado caráter “principiológico” do Código, cabe recordar os vários estudos de Metodologia e Teoria do Direito que, faz décadas, tem acompanhado, aqui e alhures, os debates acerca da recodificação no Direito Civil67: é conquista da ciência do Direito a convicção sobre as mútuas (e polarmente opostas) vantagens e desvantagens das técnicas de legislar pelo método casuístico e pelo método das cláusulas gerais e dos princípios. A estes e às cláusulas gerais é assinalada, como desvantagem, a insegurança que pode advir de decisões contraditórias ou díspares sobre uma mesma situação de fato, podendo acarretar o vício do arbítrio judicial, uma vez serem vazados, comumente, em linguagem semanticamente vaga, sendo imprecisos os termos da fattispecie que contém. Por isso o método de “legislar por princípios” é, reconhecidamente, produtor de insegurança, podendo ocasionar “problemas de coordenação, conhecimento, custos e controle de poder”68. Porém, sendo, por igual, condição para proporcionar uma elasticidade ou flexibilidade da lei, por vezes desejável, os autores69 recomendam a combinação, sempre prudente e cautelosa, entre ambas as técnicas legislativas, os princípios e as cláusulas gerais funcionando como “válvulas de abertura” do sistema. Se não ocorresse tal combinação ou composição metodológica, aliás, certo é que um “código principiológico” frustraria a própria função a que estão direcionados os códigos, a saber: proporcionar certeza e segurança sobre as regras do tráfego jurídico, possibilitando a sua aplicação o mais possível infensa a contradições lógicas e axiológicas.
3.2.1. Neste aspecto, aliás, mais uma contradição se revela: conquanto reivindique um “Código principiológico”, o seu elaborador, Professor Fábio Ulhôa Coelho, escreveu, no livro em que defende a sua proposição, um art. 843, assim redigido: “Nenhum princípio, expresso ou implícito, pode ser invocado para desconstituir obrigação contratual ou dispensar a parte do seu cumprimento, se não houver disposição deste Código invalidando a cláusula em que ela é prevista”70. O PL 1572/2011 suprimiu tal proposição, mas acabou por ainda reforçá-la, prescrevendo no art. 8o: “Nenhum princípio, expresso ou implícito, pode ser invocado para afastar a aplicação de qualquer disposição deste Código ou da lei.” A proposição é, em quaisquer de suas versões, fundamentalmente antinômica ao alegado “caráter principiológico”, pois vem decretar a inanidade dos princípios jurídicos em matéria comercial, rejeitando, outrossim, firmes conquistas da Teoria Jurídica desde, pelo menos, meio século71.
4. Por fim, quanto a soluções previstas pelo Código Civil e que se mostram disfuncionais ou ultrapassadas, crê-se que o caminho mais adequado – porquanto mais célere, eficaz e menos inseguro – estaria na proposição de alteração legislativa pontual daquelas soluções.
5. São estas as razões iniciais que desaconselham o apoio a um ‘novo” Código Comercial, sendo recomendada a constituição de Comissão de especialistas, efetivamente pluralista do ponto de vista técnico e ideológico, para estudar e, eventualmente, propor, mudanças pontuais àquelas regras do Código Civil que a experiência comprovada no decênio transcurso desde a sua vigência mostra ser aconselhável modificar.
Declaração de Interpretação n.: 21
O dano exclusivamente moral também é realizável nos casos de abuso de direito e responsabilidade civil objetiva, não sendo restritivo à previsão constante do artigo186 do CC.
Autor(a): SERRA VIEIRA, Patricia Ribeiro
Declaração de Interpretação n.: 22
A perda de uma chance é modalidade de dano, sendo-lhe intrínseca a sua autonomia diante do conceito de lucros cessantes.
Autor(a): SERRA VIEIRA, Patricia Ribeiro
Declaração de Interpretação n.: 23
A teoria da responsabilidade civil pela prática da atividade naturalmente arriscada leva em consideração não mais somente a realização da justiça entre as partes envolvidas – ofensor e vítima – mas sim o interesse da sociedade, funcionalizada pela apreensão do tecido social.
Autor(a): AGUIAR, Roger Silva
Declaração de Interpretação n.: 24
No reconhecimento do adimplemento substancial, a insignificância do descumprimento da obrigação contratual deve ser apreciada qualitativamente, e não simplesmente sob o prisma quantitativo, observando-se se subsiste, diante das circunstâncias do caso concreto, a utilidade da prestação para o credor.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da; BARTHOLO, Bruno Paiva.
Declaração de Interpretação n.: 25
É válida e eficaz a disposição de vontade (testamento vital) em que a pessoa delibera sobre que tipo de tratamento ou de não-tratamento deseja para o caso de se encontrar doente em estado terminal e sem condições de manifestar a sua vontade. As hipóteses de não-tratamento se restringem àquelas da prática de ortotanásia.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da; BARTHOLO, Bruno Paiva.
Declaração de Interpretação n.: 26
A Lei n. 11.697/08, que deu nova redação aos arts. 1.583 e 1.584, do Código Civil, não restringe os modelos de guarda dos filhos à guarda unilateral e à guarda compartilhada, podendo ser adotado o modelo mais adequado à situação do filho menor, em atendimento ao princípio do melhor interesse da criança.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da
Declaração de Interpretação n.: 27
O cônjuge sobrevivente, casado no regime da separação convencional de bens com o falecido, tem direito à herança, na concorrência sucessória com os descendentes do falecido, nos termos do art. 1829, I, do Código Civil.
Autor(a): GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
Declaração de Interpretação n.: 28
A não recepção da Lei 5.260/67 pela Carta de 1988 não impede que se considere no caso de ilícito civil praticado pela imprensa a publicação da decisão judicial como elemento integrativo da compensação pelo dano moral experimentado pela vítima, em sintonia com a extensão do ilícito praticado, com sustentação no artigo 5º, incisos X e X da Constituição Federal e artigos 186 e 944, ambos do Código Civil. Ademais, tem-se como certo que a condenação por ilícito civil por danos morais haverá de representar adequadamente a extensão do sofrimento da vítima, com plenitude e justiça, sendo que os elementos integrativos do pedido servirão como balizadores ao julgador para a minimização dos danos experimentados por ela, razão pela qual poderão conter obrigação de pagar soma em dinheiro e, cumulativamente, obrigação de fazer (publicação de parte da sentença ou acórdão quando se tratar de ilícito praticado pela imprensa).
Leia maisDeclaração de Interpretação n.: 01
O parágrafo único do artigo 927 do Código Civil é cláusula geral de responsabilidade civil objetiva, sendo a modalidade risco criado o gênero, a partir do qual o Juiz identificará a espécie aplicável ao caso concreto.
Autora: SERRA VIEIRA, Patricia Ribeiro
Declaração de Interpretação n.: 02
Para que incida a responsabilidade objetiva, independente de culpa, prevista no parágrafo único do art. 927 do Código Civil, não se exige que a atividade de risco tenha fins lucrativos.
Autor: GONÇALVES, Carlos Roberto.
Declaração de Interpretação n.: 03
O ato abusivo, previsto no art. 187 do Código Civil, constitui categoria autônoma de antijuridicidade.
Declaração de Interpretação n.: 04
Pode ser qualificada como abusiva a omissão da prática do ato, e não apenas o seu exercício.
Declaração de Interpretação n.: 05
O conceito de ato abusivo se aplica tanto aos direitos subjetivos, como a outras prerrogativas, como as liberdades, faculdades, funções ou poderes.
Autora: CARPENA, Heloisa.
Declaração de Interpretação n.: 06
O valor de 30 (trinta) salários mínimos a que se refere o artigo 108 do Código Civil, é o atribuído pelas partes contratantes, obedecidos os princípios da boa-fé objetiva e da razoabilidade, e não qualquer outro valor arbitrado pela Fazenda Pública com finalidade tributária.
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Declaração de Interpretação n.: 07
O alimentante dispõe de “ação de fiscalização de pensão alimentícia” em face daquele que administra a respectiva verba, com base no art. 1.589 do Código Civil. Diante da natureza personalíssima da relação de direito material, a comprovação das despesas de manutenção do alimentando não será realizada nos moldes do art. 914 e seguintes do CPC, fazendo-se mister transcender os estritos limites do procedimento especial.
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Declaração de Interpretação n.: 08
A transação celebrada entre o condômino e o condomínio quanto ao pagamento parcelado do débito condominial, e estando cumprindo o acordado, autoriza sua participação nas assembléias e nelas votar.
Autor: SOUZA, Sylvio Capanema.
Declaração de Interpretação n.: 09
A cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente é ineficaz, em relação aos demais herdeiros, salvo se todos com ela anuírem, até que se homologue a partilha, passando a produzir todos os seus efeitos se o bem cedido vier a integrar o quinhão hereditário do cedente. É dever do tabelião, neste caso, informar o cessionário quanto à natureza condicional da cessão e seus efeitos futuros.
Autor: SOUZA, Sylvio Capanema.
Declaração de Interpretação n.: 10
Concorrendo o cônjuge com descendentes, e havendo descendentes comuns e exclusivos do falecido, deve ser feita a partilha por cabeça.
Autor: SOUZA, Sylvio Capanema.
Declaração de Interpretação n.: 11
O desatendimento da função social contratual configura violação de dever jurídico específico, independentemente de afetar as respectivas prestações típicas ou principais, e à luz do sentido do art. 421 do Código Civil, esse descumprimento da função social pode corresponder a uma forma de inadimplemento ou inexecução do contrato.
Autor: FACHIN, Luiz Edson
Justificativa: O novo código Civil contém cláusula geral que tutela interesses meta-individuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana3. Além disso, mitiga o princípio da relatividade dos efeitos em relação a terceiros, bem como reforça o princípio da conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas4.
Doutrina e jurisprudência têm intentado refletir e definir, de um lado, a razão e os limites da função social, e de outro, as conseqüências do descumprimento dessa função.
Não raro, é no plano da existência ou validade da avença a seqüela da não observância da função social do contrato.
Sem embargo, o presente singelo ensaio sustenta que, no Direito Civil brasileiro, diante do teor do novo Código Civil, pode emergir responsabilidade contratual, quer de contrato válido, “concluído entre o responsável e a vítima”5, quer de contrato nulo ou ineficaz. Como escreve José de Aguiar Dias, em tal caso a responsabilidade oferece “à parte a quem compete a respectiva ação a escolha entre demandar com fundamento nas relações do contrato e pedir a reparação do dano extracontratual”6.
Afasta-se, aqui, o brocardo quod nullum est, nullum effectum producit.
O descumprimento da função social, em nosso ver, pode corresponder ao inadimplemento ou inexecução do contrato, e caracterizando-se aí responsabilidade sem culpa7.
Para melhor expor essa idéia cumpre retomar o núcleo do tema da função social do contrato.
Como sustenta em sua tese Paulo Nalin, a função social do contrato apresenta duas dimensões: uma intrínseca à relação entre os contratantes, que respeita ao seu equilíbrio, segundo os princípios da justiça contratual e da boa-fé objetiva, e uma extrínseca que é pertinente à repercussão que diz respeito aos “efeitos do contrato no largo campo das relações sociais”.8
Nesse sentido, exempli gratia, o contrato em que se apresenta onerosidade excessiva não atende à dimensão intrínseca do princípio da função social.
Remarque-se que a função social do contrato é contemplada expressamente pelo Código Civil de 2002, em seu artigo 421:
“Art. 421 – A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.
Não foi, todavia, o Código Civil de 2002 que instituiu a função social do contrato, que já estava presente no ordenamento jurídico, assentada no princípio da solidariedade, bem como na funcionalização da ordem econômica, operada pelo artigo 170 da Constituição.
Isso implica dizer que os contratos estão submetidos a uma função social, que se põe como princípio de ordem pública.
Como se sabe “o contrato possui uma função social que se liga à solidariedade entre as partes contratantes, mas que a elas não se resume, atingindo também aqueles que não se colocam como partes naquela relação contratual”.9
Nessa ordem de idéias, tem-se com clareza que um contrato realizado pode possuir um sentido teleológico que extrapola em muito a relação entre os contratantes.
O contrato, escreveu ENZO ROPPO, “não é um elemento da realidade física, cuja existência se possa propriamente constatar, tal como é possível constata-la quanto aos objetos do mundo natural”, e de conseqüência, “a formação de um contrato consiste num processo, isto é, numa seqüência de atos e comportamentos humanos”10. Por isso mesmo, tem inteiro cabimento a lição espirituosa do professor Alberto TRABUCCHI, da Universidade de Padova: “l’experienzia insegna che allá conclusione del contratto si arriva in mille modo diversi: dalle tratative complesse in fasi progressive che si rendono necessarie per ingiungere faticosamente all “in idem placitum, fino all’espressione piú simplice di chi porge il denaro al fatorino per acquistare il biglietto dell’autobus”11.
Porém, os princípios de probidade e de boa-fé guardam outra racionalidade de fundamentação, diversa da função social.
No entanto, duas semelhanças emergem entre o conteúdo das conseqüências pela não observância dos preceitos contidos nos artigos 421 e 422 do Código Civil: tanto também em tal hipótese a violação de tais princípios também constitui espécie de inadimplemento12, quanto os princípios da probidade e da confiança são preceitos de ordem pública que incidem nas relações interprivadas.
Não se confunda com o dano de confiança (in contrahendo), o tema que aqui se situa no campo do dano de cumprimento (in contractu). Trata-se, pois, de responsabilidade civil contratual.
Em suma, é caso de violação do interesse positivo, emergindo danos do não cumprimento do contrato pela não observância ou desaproveitamento da função social; o mesmo será, em juízo de proporcionalidade, diante do seu cumprimento defeituoso ou tardio. O desaproveitamento da função social configura da violação de dever jurídico específico, independentemente de afetar as respectivas prestações típicas ou principais.
Declaração de Interpretação n.: 12
A função social prevista no artigo 421 do Código Civil é conceito aberto e de aplicação imediata da limitação funcional da autonomia privada.
Autor: FERREIRA, Alexandre Elias.
Justificativa: Princípio clássico é o que se denomina de “pacta sunt servanda”, sustentado pelo princípio da autonomia da vontade, consagrado na Constituição Federal, em seu Artigo 5º, II, “ verbis”: Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. 13
Esse princípio, autonomia da vontade, é precedido de outro, que obriga as partes. Trata-se da obrigatoriedade das convenções; no dizer de Caio Mário da Silva Pereira:
o princípio da força obrigatória do contrato contém ínsita uma idéia que reflete o máximo subjetivismo que a ordem legal oferece: a palavra individual, enunciada na conformidade da lei, encerra uma centelha de criação, tão forte e tão profunda, que não comporta retratação, e tão imperiosa que, depois de adquirir vida, nem o Estado mesmo, a não ser excepcionalmente, pode intervir, com o propósito de mudar o curso de seus efeitos. 14
Muitas vezes há a identificação da autonomia da vontade com a liberdade de estipulação negocial, mas essa é mais restrita que aquela, vez que a autonomia de vontade engloba questões patrimoniais e existenciais.
Em nome do princípio da autonomia da vontade, opera-se a resistência do indivíduo à intromissão do Estado no espaço que deve ser só seu, na legítima tentativa de ser feliz. Por isso mesmo, a autonomia da vontade assume novas dimensões, tais como: a luta pelo direito à redesignação sexual, o reconhecimento de diferentes modelos de família (matrimonial, não-matrimonial, monoparental etc.), o modelo de filiação voltado antes para a paternidade socioafetiva do que para a paternidade apenas biológica, a união legal de pessoas do mesmo sexo, entre outras15.
É a faculdade do indivíduo de regular suas próprias relações jurídicas, estabelecendo conteúdo e enquadramento jurídico, tudo através da mais legítima e não viciada vontade daquele.
Característica marcante da autonomia da vontade é sua conotação subjetiva, enquanto a autonomia privada tem um conteúdo mais objetivo, devendo ser vista como algo mais concreto.
A autonomia privada é o poder jurídico, conferido aos particulares, de criar as regras jurídicas disciplinadoras das relações de que fazem parte. É o poder de criar, modificar ou extinguir situações jurídicas próprias ou de outrem. Além disso, é princípio aberto, vez que não se encerra em norma jurídica, mas consubstancia uma diretriz, um ideal; e também critério interpretativo (arts. 112, 114, 819 e 1899, todos do Código Civil de 2002)16.
Em matéria de direito patrimonial, as normas podem ser de natureza dispositiva ou supletiva. Quando cogentes, sua interpretação é estrita, como é o caso do artigo 489 do Código Civil de 200217.Tal poder advém do Estado, que pode ser intervencionista ou assistencial, o que gera a fixação de limites.
Os limites da autonomia privada são a ordem pública, que é uma gama de normas que zelam pelo interesse da sociedade e estabelecem as diretrizes fundamentais da ordem econômica.
Observa-se que a crise não é da autonomia privada, mas de sua concepção tradicional, já que a autonomia apresenta novos contornos e nova concepção sob a ótica humanista.
Tem-se a liberdade e a dignidade da pessoa humana como valores jurídicos de especial relevância. A liberdade é o pressuposto da autonomia privada; sem liberdade não se pode falar em eficácia jurídica do negócio celebrado.
A autonomia privada passa por um processo de revisão e de releitura, onde os contratos de massa são questionados dentro dade filiação voltado antes para a paternidade socioafetiva do que para a paternidade apenas biológica, a união legal de pessoas do mesmo sexo, entre outras15.
É a faculdade do indivíduo de regular suas próprias relações jurídicas, estabelecendo conteúdo e enquadramento jurídico, tudo através da mais legítima e não viciada vontade daquele.
Característica marcante da autonomia da vontade é sua conotação subjetiva, enquanto a autonomia privada tem um conteúdo mais objetivo, devendo ser vista como algo mais concreto.
A autonomia privada é o poder jurídico, conferido aos particulares, de criar as regras jurídicas disciplinadoras das relações de que fazem parte. É o poder de criar, modificar ou extinguir situações jurídicas próprias ou de outrem. Além disso, é princípio aberto, vez que não se encerra em norma jurídica, mas consubstancia uma diretriz, um ideal; e também critério interpretativo (arts. 112, 114, 819 e 1899, todos do Código Civil de 2002)16.
Em matéria de direito patrimonial, as normas podem ser de natureza dispositiva ou supletiva. Quando cogentes, sua interpretação é estrita, como é o caso do artigo 489 do Código Civil de 200217.Tal poder advém do Estado, que pode ser intervencionista ou assistencial, o que gera a fixação de limites.
Os limites da autonomia privada são a ordem pública, que é uma gama de normas que zelam pelo interesse da sociedade e estabelecem as diretrizes fundamentais da ordem econômica.
Observa-se que a crise não é da autonomia privada, mas de sua concepção tradicional, já que a autonomia apresenta novos contornos e nova concepção sob a ótica humanista.
Tem-se a liberdade e a dignidade da pessoa humana como valores jurídicos de especial relevância. A liberdade é o pressuposto da autonomia privada; sem liberdade não se pode falar em eficácia jurídica do negócio celebrado.
A autonomia privada passa por um processo de revisão e de releitura, onde os contratos de massa são questionados dentro dade filiação voltado antes para a paternidade socioafetiva do que para a paternidade apenas biológica, a união legal de pessoas do mesmo sexo, entre outras15.
É a faculdade do indivíduo de regular suas próprias relações jurídicas, estabelecendo conteúdo e enquadramento jurídico, tudo através da mais legítima e não viciada vontade daquele.
Característica marcante da autonomia da vontade é sua conotação subjetiva, enquanto a autonomia privada tem um conteúdo mais objetivo, devendo ser vista como algo mais concreto.
A autonomia privada é o poder jurídico, conferido aos particulares, de criar as regras jurídicas disciplinadoras das relações de que fazem parte. É o poder de criar, modificar ou extinguir situações jurídicas próprias ou de outrem. Além disso, é princípio aberto, vez que não se encerra em norma jurídica, mas consubstancia uma diretriz, um ideal; e também critério interpretativo (arts. 112, 114, 819 e 1899, todos do Código Civil de 2002)16.
Em matéria de direito patrimonial, as normas podem ser de natureza dispositiva ou supletiva. Quando cogentes, sua interpretação é estrita, como é o caso do artigo 489 do Código Civil de 200217.Tal poder advém do Estado, que pode ser intervencionista ou assistencial, o que gera a fixação de limites.
Os limites da autonomia privada são a ordem pública, que é uma gama de normas que zelam pelo interesse da sociedade e estabelecem as diretrizes fundamentais da ordem econômica.
Observa-se que a crise não é da autonomia privada, mas de sua concepção tradicional, já que a autonomia apresenta novos contornos e nova concepção sob a ótica humanista.
Tem-se a liberdade e a dignidade da pessoa humana como valores jurídicos de especial relevância. A liberdade é o pressuposto da autonomia privada; sem liberdade não se pode falar em eficácia jurídica do negócio celebrado.
A autonomia privada passa por um processo de revisão e de releitura, onde os contratos de massa são questionados dentro da concepção de valoração e análise do novo contexto de observância das normas jurídicas.
A autonomia evoluiu de uma análise essencialmente individualista, onde toda a estrutura de poder era colocada em prol dos interesses particulares. O indivíduo é o marco inicial e o final, o que influencia os aspectos de reparação civil, que passa a observar um contexto mais social e menos individualista.
Na Alemanha e na Itália o princípio da autonomia da vontade ganhou uma dimensão objetiva, significando o poder jurídico dos particulares.
No Brasil não houve tanta receptividade a essa concepção, o que se explica pela história da nação, de governos unitários, autocráticos e intervencionistas, em que não se dá espaço suficiente aos valores do individualismo e do liberalismo, sempre postergados18.
Instrumento de um processo econômico e sempre político, alicerçado em liberdade e igualdade formais, a autonomia privada passa a ter novos horizontes. A Igualdade material é o novo fim, onde todos têm real e efetiva oportunidade no contexto econômico.
A autonomia deve ser incentivada. A mola do desenvolvimento sempre foi a liberdade e os pactos entre os particulares. O Estado deve intervir apenas quando for indispensável e estritamente necessário. Os particulares têm na autonomia fator de fomento de sua atividade e desenvolvimento de seu potencial empreendedor.
Sob essa ótica, tem-se como conseqüência da autonomia: a liberdade contratual (possibilidade de contratar, escolher com quem contratar, estabelecer o conteúdo da avença, a forma e os efeitos do ajuste); a força obrigatória dos contratos (a vontade particular estabelece uma lei entre as partes contratantes, de forma que essas estão vinculadas ao cumprimento do contrato); o efeito relativo dos contratos (a eficácia do contrato se restringe aos contratantes, não afetando terceiros – o que atualmente não é mais visto dessa forma); o consensualismo, para que o contrato se estabeleça e as obrigações surjam; basta o consentimento livremente manifestado, prescindindo-se de forma especial.
No que tange ao objeto, sendo lícito, não há por que se perquerirem os motivos de declaração de vontade; essa vale por si mesma.
Como crítica à autonomia da vida privada, tem-se o aspecto filosófico, onde se observa que o homem é um ser social e, assim, onde restrições e condicionamentos na sua capacidade de agir são inevitáveis. Do ponto de vista moral, a igualdade e a liberdade não se realizam harmonicamente, vez que a igualdade é meramente formal, havendo aparentes desigualdades sociais; a liberdade contratual acentua os desníveis econômicos, exigindo a intervenção estatal, de modo a tutelar-se o mais fraco, estabelecendo-se normas imperativas essenciais.
Do ponto de vista econômico, o Estado precisava intervir na organização e disciplina dos setores básicos da economia, não podendo deixar à mercê de interesses particulares a condução da vida econômica, em especial onde reinasse a desigualdade econômica e, conseqüentemente, social. Não podendo ser mais tolerado o liberalismo do século XIX, e assim surge uma ordem pública econômica em seu sentido mais efetivo.
Nesse contexto, pode-se falar em socialização do direito civil, onde há o primado dos interesses sociais preponderando, inclusive e especialmente, sobre os interesses de natureza particular, o que restringe a atuação particular, tendo como limitação o interesse público da comunidade.
De um Estado liberal para o intervencionista há a nítida superação do liberalismo econômico e o questionamento quanto ao dogma da vontade, de origem claramente marxista19.
Com a consagração de princípios constitucionais ligados ao direito civil, houve uma ligação do direito público e privado, de modo a conferir, aquele a esse, uma dimensão social, sendo ambos destinados a proverem o bem-estar social.
Mesmo tendo diminuição no seu campo de incidência, a autonomia privada permanece como essência do direito obrigacional; mas, agora, está marcada por obrigatoriedade de contratar, proibição na contratação, aplicação da responsabilidade objetiva em diversas hipóteses de incidência e obediência ao princípio da boa-fé objetiva.
Sob esse aspecto deve-se questionar qual a sua função no interior do sistema jurídico. Sociedade e direito interagem de forma mais visível na busca da eficácia social e econômico-social, em uma visão distributiva e socializante.
A funcionalização é o reconhecimento e o exercício do poder que dela decorre, que faz promover a circulação de bens e a prestação de serviços, todos condicionados à utilidade social que tal promoção representa, tendo-se em vista o bem comum e a igualdade material. É a fixação de limites para o exercício da faculdade conferida ao particular de auto- -regular suas relações jurídicas.
A sobreposição dos interesses sociais sobre os particulares é a atribuição ao direito uma função social. Não se elimina a liberdade individual, mas é feita uma reapreciação valorativa de sua aplicação em um contexto social.
Assim, função social é uma orientação não colidente com direitos subjetivos, mas que busca prestigiar o bem comum e a justiça social. Aplicação imediata da limitação funcional da autonomia privada vem prevista no artigo 421: “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.20
Sem dúvida, trata-se de conceito aberto, mas inspirado no prestígio à comunidade e na superação do individual para o social.
Declaração de Interpretação n.: 13
À luz do princípio da função social do contrato, a supressão da realização de reuniões e assembléias, com base no art. 70, da Lei Complementar nº 123/06, diante do enquadramento de uma sociedade como microempresa ou empresa de pequeno porte, não está autorizada de imediato e se impõe, para tanto, a manifestação dos sócios sobre o modo pelo qual serão tomadas as decisões sociais.
Autor: ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção
Justificativa: O enquadramento de uma sociedade simples ou empresária como micro ou pequena empresa torna facultativa a realização de assembléias ou reuniões de sócios, exceto para a deliberação onde será decidida a exclusão do sócio minoritário (art. 1085 do Código Civil). Nos demais casos, a decisão que seria coletiva passa a ser tomada exclusivamente pelo sócio ou sócios que possuam 51% ou mais do capital social (art. 70 da LC 123/06).
Tal dispositivo altera profundamente o quorum para aprovação de matérias importantes, como a alteração do contrato social ou a proposta de fusão, incorporação, dissolução ou cessação do estado de liquidação da sociedade, todas com quorum mínimo de três quartos do capital social para serem aprovadas, na sociedade limitada, segundo determina o art. 1076, I, do Código Civil. Na sociedade simples, a alteração de cláusulas obrigatórias do contrato social (v.g. objeto, sede, prazo, capital) depende de deliberação unânime (art.999).
A implementação do regime deliberativo “individual” ou “majoritário” não pode ser automática com o enquadramento da sociedade, por interferir diretamente nos direitos dos sócios minoritários, que teriam poder de vetar a aprovação da matéria (caso exigida a unanimidade), ou daqueles que representassem mais de ¼ do capital social.
Com a supressão da convocação de reuniões ou assembléias a sociedade passa a ser um alter ego da vontade do sócio majoritário, em total detrimento da vontade dos minoritários, que sequer poderiam usar seu direito de voto nas deliberações sociais. Ademais, altera-se visivelmente a participação dos sócios nas decisões sociais, eis que matérias que dependeriam do consentimento de todos ou de uma maior maioria passarão a ser decididas por um sócio ou um pequeno grupo. Percebe-se que a função social do contrato (princípio de ordem pública) está sendo desrespeitada nitidamente em seu aspecto interno (partes contratantes), privando os sócios inclusive da manifestação do voto e impondo-lhes seguir a decisão do sócio titular de 51% do capital, inclusive para decisões que implicam a extinção da sociedade, como a fusão e a sua incorporação por outra.
Além do aspecto interno da função social do contrato, não se pode olvidar que a sociedade mantém relações com terceiros (credores, empregados, consumidores etc) e que a vontade da pessoa jurídica é manifestada pelo seu órgão. A supressão da realização de assembléias ou reuniões implica transferir a vontade da pessoa jurídica para seu sócio majoritário. Diga-se de passagem, isso já acontece quando o sócio é titular de 75% ou mais do capital; porém, mesmo assim devem ser realizados conclaves onde os sócios têm o direito de decidir e votar as questões do interesse social. A implementação do art. 70 implica tanto da não realização desses conclaves como também na transferência de um poder total para aquele que possui 51% do capital. Por conseguinte, este sócio está autorizado pela lei (e imediatamente conforme o ponto de vista interpretativo que se combate) a decidir tudo o que se refira à sociedade, tornando a pessoa jurídica uma externalização de sua personalidade.
Sem embargo, não se pode impor aos sócios minoritários a rejeição da aplicação do art. 70, mas dar-lhes a opção de manter o regime deliberativo do Código Civil ou delegar ao sócio majoritário que passe a tomar por eles as decisões. Para tal, é imprescindível a alteração do contrato social pelo quorum legal, até mesmo porque a mudança do regime deliberativo deve ser informada a terceiros através do arquivamento da ata no registro da sociedade, consoante o regime de publicidade dos atos societários (arts. 1150 e 1154 do Código Civil).
Declaração de Interpretação n.: 14
No âmbito empresarial, a observância da função social do contrato de sociedade pressupõe o atendimento à função social da empresa, a qual se perfaz por meio dos princípios do art. 170 da Constituição Federal, bem como dos demais deveres necessários ao justo exercício da atividade empresarial.
Autores: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da; BARTHOLO, Bruno Paiva
Justificativa: Essa sugestão interpretativa visa a traçar um conteúdo mínimo para a noção de função social da empresa, intrinsecamente relacionada à função do contrato, reafirmando e complementando, dessa maneira, o reconhecimento desse poder-dever na seara empresarial, já expresso no Enunciado n. 53 da I Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal. Sem dúvida, é indiscutível a relevância do papel da empresa – compreendida como atividade econômica estruturalmente organizada em fatores de produção21 – no mundo contemporâneo, não apenas por sua importância social, econômica e política22, como também por sua influência na formação do comportamento das outras instituições e grupos sociais23. Por esse motivo, apesar da omissão legislativa na hodierna codificação civil brasileira, resta imprescindível a consolidação de um conceito de função social desse instituto que venha a imprimir, em consonância com os parâmetros constitucionais, deveres negativos e positivos ao empresário e ao administrador da empresa24, não somente se confundindo com a mera função econômica daquela, satisfeita por meio de sua simples condição de fonte geradora de trabalho e de lucro, nem se restringindo ao cumprimento de deveres de cunho negativo.
Ainda cumpre destacar que a função social da empresa, albergada como pressuposto de legitimidade da própria atividade empresarial em proposta de modificação do art. 966 do Código Civil25, possui relação direta com a incontestável função social exercida por outros dois institutos, quais sejam, a propriedade (arts. 5º, inc. XXIII, e 170, inc. III, CF), particularmente no que tange aos bens de produção necessários à prática empresarial, e o contrato (art. 421, CC), tendo em vista a natureza contratual inerente à maioria das sociedades empresárias, que respondem pela esmagadora parte dos empreendimentos empresariais, e a presença desse instrumento negocial na maior parte das atividades exercidas pelos empresários.
De mais a mais, a efetiva consecução desse fim social da empresa só será possível mediante atividade promocional por parte dos empresários, consistente em obediência a deveres positivos, dentre os quais, inevitavelmente, aqueles expressos nos princípios do art. 170, CF. De fato, a reles orientação da função social da empresa consoante a imposição de deveres negativos, consistentes, em termos gerais, na vedação à provocação de prejuízos a terceiros, demonstra-se insuficiente para assegurar a justiça social e a existência digna de todos26, satisfazendo apenas, prioritariamente, os interesses individuais do empresário. O maior exemplo dessa lógica diz respeito à preservação do meio ambiente, a qual se perfaz, eficazmente, mediante comportamento pautado pela prevenção de danos, e não pela simples responsabilização por eles, e, levando-se em conta que o exercício da atividade empresarial afeta, inevitavelmente, tal meio, pelo emprego de recursos naturais, só é possível o respeito ao princípio supracitado por intermédio de condutas positivas e compensatórias do uso daqueles recursos.
Esse raciocínio se estende aos demais princípios inseridos no mencionado dispositivo constitucional, ressalvadas as devidas peculiaridades. Tal assertiva pode ser confirmada pelas mais recentes leis aprovadas em relação às matérias respectivas, quer se trate de reforma legislativa, quer de verdadeira inovação no ordenamento, como a edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), que impõe, dentre suas inúmeras disposições protetoras do consumidor, o respeito à boa-fé objetiva e aos seus deveres anexos; a Lei n. 8.884/94, que determina parâmetros para evitar o abuso do poder econômico, permitindo a manutenção da livre-iniciativa e da livre concorrência, e a Lei de Recuperação Judicial (Lei n. 11.101/05), que estabelece novas diretrizes no sentido da reorganização ou da reestruturação da empresa27, e não mais singelas medidas de apuração e de liquidação do patrimônio do empresário para a satisfação de seus credores, e isso implica, inclusive, a possibilidade de intervenções na administração da empresa em decorrência de má gestão, por exemplo, sempre visando à sua preservação.
Por fim, deve-se ressaltar que, se os parâmetros previstos no art. 170, CF, são essenciais para a concretização da função social da empresa, não podem, por outro lado, ser os únicos, já que os deveres configuradores dessa função social não se esgotam no plano constitucional ou de leis ordinárias, devendo-se sempre observar o exercício justo da atividade empresarial28, o qual se depreende da constante atividade interpretativa dos operadores do Direito.
Declaração de Interpretação n.: 15
Não corre a prescrição entre os companheiros (CF, art. 226, § 3º) durante a constância da família por eles formada.
Autor: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
Justificativa: As causas de impedimento e de suspensão do curso do prazo prescricional se fundamentam ora em razões de ordem moral, ora em razões de proteção ou defesa de pessoas que não teriam condições de acompanhar a situação jurídica ativa da qual são titulares, ora por outros motivos arrolados na lei.
Quanto às primeiras — razões de ordem moral —, o art. 197 do Código Civil de 2002 estabelece que não corre a prescrição: a) entre os cônjuges29, na constância da sociedade conjugal (em substituição ao termo “matrimônio”, que constava do inciso I do art. 168 do Código de 1916, devido à introdução do divórcio em 1977 no Brasil)30 ; b) entre ascendentes e descendentes durante o período do poder familiar (substituindo a expressão “pátrio poder”, que constava do inciso II do art. 168 do texto revogado); c) entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, respectivamente, durante a tutela e a curatela31.
Todas as causas elencadas no art. 197, citado, referem- se aos vínculos mais próximos no Direito de Família, tendo a lei considerado que, diante das relações jurídicas fundadas na afetividade, no cuidado e no amparo, não se pode admitir o curso do prazo prescricional.
Deve-se considerar, também, no inciso I do art. 197, a não-contagem do prazo prescricional entre os companheiros enquanto pender a relação fundada no companheirismo, porquanto a ratio legis diz respeito à proteção da família e aos vínculos mais próximos, como nos exemplos dos cônjuges e dos pais e filhos durante o poder familiar. Não se trata de invocar a analogia para a hipótese, mas sim de interpretar sistemática e teleologicamente a referida norma, inclusive com a incidência, na hipótese, do disposto no art. 226 da Constituição Federal.
Declaração de Interpretação n.: 16
O art. 71 da Lei Complementar 123/06 é inaplicável sempre que a publicação do ato for necessária para o resguardo ou exercício do direito de terceiros (v. g. arts. 1144, 1146 e 1084, § 1º do CC).
Autor: ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção.
Justificativa: A Lei Complementar nº 123/2006 (Lei do Simples Nacional) contém dispositivos que estabelecem regras civis e empresariais próprias para micro e empresários de pequeno porte devidamente enquadrados no órgão competente (Capítulo XI). Dentre as regras tem relevo para a presente proposta o art. 71 – dispensa da publicação de atos societários pelas sociedades e empresários individuais.
Preliminarmente cumpre destacar a má redação do dispositivo, eis que jamais um empresário individual praticará “atos societários”. De fato, o sentido do dispositivo é dispensar todos aqueles que forem enquadrados com ME ou EPP da publicação de atos exigidos “nos termos da legislação civil”, sejam eles societários ou não, do contrário o dispositivo seria inócuo para o empresário individual.
É imperativo recordar que a alienação, arrendamento ou usufruto do estabelecimento é um ato societário, pois tem a sociedade como parte no negócio jurídico (alienante, arrendador ou nu-proprietário) e este diz respeito à atividade por ela desenvolvida. Por conseguinte, sustenta-se que o art. 71 da LC 123/06 contemplaria, em tese, as hipóteses do art. 1144 do Código Civil, dispensando o empresário ou sociedade empresária de publicar na imprensa oficial o contrato correspondente, bastando averbá-lo no registro competente.
Sem embargo, a dispensa de publicação do contrato, conquanto desonere o micro ou pequeno empresário do custo de publicação – consoante o espírito da lei de dar àqueles nela enquadrados um tratamento diferenciado, inclusive para eliminar certas obrigações contidas na legislação – não pode alcançar o direito de terceiros, mormente quando a publicação do ato societário é imperativa para fixar o termo a quo de certos prazos ou possibilitar o exercício de direitos. Nessa linha de interpretação, verifica-se que o legislador civil no art. 1144 condicionou a eficácia da alienação, arrendamento ou usufruto do estabelecimento à averbação e publicação do contrato com a intenção certa e objetiva de dar uma publicidade especial ao ato, não se contentando com a simples averbação no registro da sociedade ou do empresário. Tal exigência não é isolada no Código, haja vista ter o legislador ora determinado uma dupla averbação (v.g. arts. 979 e 980), ora determinado a averbação e publicação do ato.
A aplicação literal do art. 71 da Lei Complementar 123/06 conduziria à impossibilidade de aplicação de artigos do Código Civil que têm como referencial a publicação de ato societário ou praticado por empresário individual, favorecendo indevidamente o empresário ou a sociedade empresária em detrimento do direito de terceiros; não é este o espírito das normas constitucionais que fundamentam a Lei do Simples Nacional (arts.146, III, d, e 179 da CF). A guisa de ilustração pode-se citar o art. 1146, onde a publicação do contrato é o termo inicial do prazo em que o devedor primitivo responde solidariamente com o adquirente pelos débitos regularmente contabilizados e vencidos.
Também cabe mencionar o art. 1084, § 1º, que prevê a necessidade de publicação da ata da assembléia ou reunião de sócios que deliberou pela redução do capital por considerá-lo excessivo em relação ao objeto social. É da publicação da ata que os credores quirografários poderão exercer o direito de oposição ao deliberado, no prazo de 90 dias.
Portanto, embora o legislador não tenha atentado para as conseqüências da aplicação irrestrita do art. 71, cabe ao intérprete ponderar seus efeitos negativos, mormente quando atinge diretamente terceiros que contratam com a sociedade.
Declaração de Interpretação n.: 17
A adoção da responsabilidade objetiva pela prática de atividade naturalmente arriscada impõe a revisão do conceito de risco que passa a estar dividido em duas figuras – risco-possibilidade e risco-probabilidade -, identificadas pelo grau de ocorrência do dano.
Autor: AGUIAR, Roger Silva.
Justificativa: Tendo em vista que o artigo 927, parágrafo único, afirma que toda atividade naturalmente arriscada importa na aplicação da responsabilidade objetiva, sobeja inelutável a constatação de que a renovação de tal preceito em outro diploma legal, que tivesse por objeto uma atividade caracterizada como geradora de perigo de dano, seria absolutamente redundante e desnecessária.
Sob esta ótica, a cláusula geral de responsabilidade objetiva pela prática de atividade naturalmente arriscada tornaria sem préstimo a fixação, em outras leis, da aplicação da responsabilidade objetiva para situações de risco. Exsurge, portanto, a indagação: teria o legislador previsto a possibilidade de fixação da responsabilidade objetiva com fundamento diverso do risco?
Uma análise do artigo 927, parágrafo único, no qual o legislador inseriu ambas as idéias (a responsabilidade objetiva pelo risco a ser firmado por lei e a cláusula geral de responsabilidade objetiva pela prática de atividade naturalmente arriscada), deixa a perspectiva de que a resposta a tal questão talvez esteja na interpretação que deva ser dada ao termo “risco”.
Como informa Sérgio Cavalieri, o “risco é o perigo, é a probabilidade de dano”32, ou seja, aquele que age deve responder pelos danos causados a outrem em razão de sua conduta – entendida como perigosa – haver criado as condições necessárias para a ocorrência do dano.
Preliminarmente, cabe observar que a responsabilidade objetiva, em sua origem, germinou a partir de situações que em geral envolviam aquilo que os leigos chamam efetivamente de perigo, que é uma circunstância concreta que prenuncia a ocorrência de um mal para alguém. Como efeito reflexo, a doutrina do risco, esteio teórico da responsabilidade objetiva, passou a ser tratada quase como um processo de causa e efeito de nossos atos33, pelo qual devemos nos submeter a tudo aquilo que, em certas situações, decorre de nossa conduta, devido ao interesse ou proveito que nos move a praticá-la34.
Neste sentido foram formatadas, na busca de um fundamento para a aplicação da responsabilidade objetiva em tais hipóteses, as teorias do risco proveito e do risco criado, sendo a primeira uma verdadeira expressão do brocardo latino ubi emolumentum, ibi ônus, ou seja, quem colhe os proveitos de uma determinada atividade deve suportar as conseqüências prejudiciais que dela decorrem; e a segunda uma ampliação da primeira, pela qual aquele que, com sua atividade, cria um perigo, fica sujeito a reparar o dano que causar.
Por força da necessidade, porém, a responsabilidade objetiva passou a ser aplicada a outras atividades, em que o caráter perigoso não se apresentava de forma tão concreta, remanescendo tão somente a possibilidade de causar danos.
Apenas a título ilustrativo confronte-se, por exemplo, o perigo suscitado pelas estradas de ferro do início do século e aquele hoje proporcionado pelos fornecedores de produtos que, à luz das previsões contidas no Código de Defesa do Consumidor, respondem objetivamente pelo fato do produto. Não resta óbvio que o perigo proporcionado por aquelas, em razão das fagulhas que as locomotivas dispensavam, era muito mais uma probabilidade concreta de dano, do que o mero risco, por exemplo, de uma máquina de lavar causar algum prejuízo ao patrimônio ou à saúde do consumidor?
No primeiro caso, a atividade ao ser desempenhada gera um perigo, no qual a possibilidade de dano se afasta daquela condição normal e se apresenta como uma perspectiva concreta para a vítima. No segundo, o risco é apenas a possibilidade de dano que a atividade humana traz ínsita em si e que pode ser erigida a uma condição de responsabilidade objetiva pelo legislador.
Na fórmula geral de responsabilidade objetiva, a figura do risco como perigo não se coaduna mais com a idéia da mera possibilidade de dano como conseqüência natural da atividade humana. Caso o termo “risco” fosse colocado com este sentido, o princípio geral faria a responsabilidade objetiva se expandir por quase todo o sistema, uma vez que praticamente todas as atividades humanas criam a possibilidade de causação de danos.
Portanto, a idéia de risco estaria dividida em duas:
a) o risco-possibilidade – relativo à assunção dos prejuízos causados a outrem, em razão da prática de uma determinada atividade que traz em si a possibilidade de causação do dano. Em tais situações, para que o agente venha a responder objetivamente, a hipótese necessariamente terá que estar estatuída em lei, conforme previsto na segunda parte do artigo;
b) o risco-probabilidade – a qualificação de uma determinada atividade como perigosa, assinalando assim a existência concreta de um perigo de dano. Esta visão estaria incutida no princípio geral e poderá ser estatuída por lei ou reconhecida pelo Judiciário.35
A não aceitação deste raciocínio conduziria necessariamente a uma destas duas situações, ambas desastrosas:
– o risco continuaria tendo o significado de assunção das conseqüências advindas de nossos atos em razão da prática da atividade perigosa, a qual gera possibilidade de causar dano a outrem – neste caso, havendo um princípio geral, a estilo do artigo 927, parágrafo único do Novo Código Civil, todas as atividades humanas estariam abarcadas pela responsabilidade que independe da culpa, já que dificilmente uma atividade não incorre na probabilidade de causar danos, ou seja, deixa de gerar risco;
– o termo risco assinalaria a atividade perigosa, ou seja, aquela que oferta uma probabilidade excessiva de produção de dano a outrem – por este viés todas as hipóteses, inclusive as legais, deveriam conter algum perigo, o que tornaria a existência do princípio geral, em concomitância com o restante da legislação, incongruente.
Declaração de Interpretação n.: 18
Só perderá o direito à indenização o segurado em mora que tiver sido previamente interpelado pelo segurador, sob pena de este ser obrigado a indenizá-lo.
Autores: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da; BARTHOLO, Bruno Paiva.
Justificativa: O artigo 763 do Código prevê medida extrema para o segurado em mora: a perda do direito à indenização, principal prestação da qual é credor e elemento fundamental da causa do contrato de seguro. Em contrapartida ao direito à indenização securitária, deve o segurado pagar, continuadamente, o prêmio, obrigação à qual está vinculado durante período que geralmente coincide com aquele em que está coberto pelos riscos.
Pela literalidade do dispositivo em comento, parece que a simples falta do pagamento de uma prestação por parte do segurado daria ensejo, automaticamente, à suspensão do direito à indenização, inclusive dando a possibilidade ao segurador de resolver o contrato, com base no art. 475 do Código. Porém, essa lógica contraria o princípio do favor debitoris, favorecendo a parte contratual mais forte em detrimento da outra, à qual se dificulta a opção pelo caminho menos oneroso, que é a purgação da mora, escolha esta preferível à resolução do contrato, hipótese em que o segurado perderia a cobertura oferecida por um contrato ao qual poderia estar vinculado, como tantas vezes sucede, por anos consecutivos.
Por essa razão, é muito mais razoável a exigência de prévia interpelação do segurado pelo segurador para que tenha aquele a oportunidade expressa de purgar a sua mora, impedindo a interrupção da cobertura oferecida. Quando mesmo, tal requisito configura-se como uma decorrência do dever de cooperação (artigo 422) que devem ter as partes entre si, considerando que ao segurador permanece o interesse na percepção do prêmio não pago regiamente, eis que se trata de prestação pecuniária36. Por fim, não se deve esquecer que o contrato de seguro envolve, na maior parte dos casos, relações de consumo, razão pela qual se deve levar em conta a condição de hipossuficiência do segurado, enquanto consumidor.
Declaração de Interpretação n.: 19
A responsabilidade do transportador aéreo em relação aos passageiros gratuitos é objetiva e contratual, por equiparação, não sendo possível aplicar a orientação contida na Súmula 145 do STJ em razão do tratamento diferenciado da matéria na legislação especial (art. 1º, do Decreto 5.910/06 e art. 256, § 2º, b, da Lei 7.565/86).
Autor: ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção.
Justificativa: O contrato de transporte (pessoas e coisas) tem na onerosidade um de seus elementos essenciais, como deixa expresso o art. 730 do Código Civil. Assim sendo, o transportador assume a responsabilidade pela condução do passageiro, ou conservação, deslocamento e entrega da carga, mediante o pagamento da passagem ou frete.
O transporte exclusivamente gratuito ou benévolo (de “amizade” ou “cortesia”, nos termos do verbete sumular 145 do STJ) não se subordina às normas do contrato de transporte, segundo o art. 736, esclarecendo o parágrafo único do indigitado dispositivo que a gratuidade aparente não tem o condão de excluir a aplicação das normas do contrato, consoante orientação consolidada da jurisprudência brasileira anterior ao CC (v. referência).
A inexistência de qualquer interesse por parte do condutor (termo mais apropriado do que transportador) em relação à pessoa por ele conduzida traz importantes conseqüências jurídicas, senão vejamos: a) dispensa de documento escrito (bilhete ou cartão de passagem); b) inexistência de regulação por parte do poder público; caracteriza-se como um “contrato unilateral”, no entendimento do STJ (v. referência); d) permite a invocação do fato de terceiro pelo condutor em caso de acidente como excludente de responsabilidade; e) exige a demonstração da culpa (“grave” ou gravíssima) ou dolo do condutor para a configuração da obrigação de indenizar.
Sem embargo da legislação geral sobre transporte do Código Civil e do entendimento sumulado do STJ, a proposta por objetivo reconhecer a vigência e prevalência da legislação especial sobre transporte aéreo – Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica) e Decreto nº 5.910/06 (Convenção de Montreal) – em relação ao art. 736, afastando a necessidade de comprovação de dolo ou culpa grave do transportador pelas vítimas ou seus sucessores.
Na legislação aeronáutica, a responsabilidade do transportador estende-se aos passageiros gratuitos, tanto no transporte doméstico (art. 256, §2º, b, CBA) quanto no internacional (art. 1º da Convenção de Montreal, in verbis: “A presente Convenção se aplica a todo transporte internacional de pessoas, bagagem ou carga, efetuado em aeronaves, mediante remuneração). Aplica-se igualmente ao transporte gratuito efetuado em aeronaves, por uma empresa de transporte aéreo), ainda que não haja qualquer vantagem indireta na prestação do serviço (ex: ajuda humanitária).
No mesmo sentido, posiciona-se a doutrina especializada de José da Silva Pacheco: “Tratando-se, como se trata, de responsabilidade contratual […], a morte indenizável há de envolver-se dos seguintes pressupostos: a) ser passageiro ou de alguém, para esse efeito, a ele equiparado, como se dá com as pessoas indicadas no parágrafo segundo deste art. 256.”
A aplicação da legislação aeronáutica aos passageiros gratuitos revela um critério especial de proteção à vítima, considerando os riscos extraordinários do transporte aéreo e superiores aos demais transportes. Destarte, no sistema indenizatório do direito aeronáutico, o transportador aéreo somente não responderá pela morte ou lesão ao passageiro se comprovar que o evento é decorrente, exclusivamente, do estado de saúde do passageiro, ou se o acidente decorrer de sua culpa exclusiva. Com isto, afasta-se completamente a dicotomia entre o pagamento ou vantagem devida ao transportador e a pura gratuidade, sem nenhuma repercussão no fundamento da atividade, que sempre será o risco.
Declaração de Interpretação n.: 20
Os arts. 1.790, 1.829 e 1.830 admitem a concorrência sucessória entre cônjuge e companheiro sobreviventes.
Autor: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
Justificativa: Ainda que seja possível, excepcionalmente, a concorrência sucessória do cônjuge sobrevivente com o companheiro sobrevivente, de acordo com o art. 1.830 do Código Civil, o falecido pode ter-se separado de fato de seu cônjuge e, nesse período, haver constituído nova família com base no companheirismo, o que é expressamente admitido no art. 1.723, § 1º, do Código Civil de 2002.
Desse modo, diante do falecimento da pessoa casada — e separada de fato há menos de dois anos — que vivia em companheirismo com outra pessoa que não seu cônjuge, será perfeitamente possível o chamamento conjunto do cônjuge e do companheiro sobreviventes em igualdade de condições relativamente aos bens adquiridos a título oneroso durante a união estável, bem como o chamamento exclusivo do cônjuge sobrevivente quanto aos demais bens deixados pelo falecido.
Cuida-se de interpretar sistematicamente, e de maneira harmônica, as regras contidas nos arts. 1.723, § 1º, 1.790, 1.830 e 1.838, todos do Código Civil de 2002.